Um Retorno do K7: Como as Fitas Estão Ganhando Cada Vez Mais Espaço no Mercado de Música
- Concreto Neves
- 30 de jun.
- 4 min de leitura
Ok, foi mal pelo trocadilho. Dia desses o Mogwai, uma das minhas bandas preferidas de post rock, lançou um álbum chamado "The Bad Fire". Está nas plataformas digitais, claro, mas também foi lançado em vinil, CD e K7. Quem diria, hein? Cá estamos resgatando aquelas fitinhas que já enroscaram em muitos rádios de carro e arrancaram lágrimas de adolescência. Pois é, o cassete está de volta, e não é só pra virar chaveiro hipster. Vem comigo que vou te contar como o K7 virou o hit retro que ninguém esperava, mas que todo mundo secretamente queria.
Quando o passado bate na porta com um walkman na mão
Lembra daquela cena clássica de tentar enrolar a fita com uma Bic? Ainda nesses anos 90, DJs como o letão Mr. Tape e o francês DJ Laurent, abriram caminho usando um mixer de fita em sets ao vivo. Pois é, esse cassete voltou, e trouxe charme, nostalgia e uma pitada de ironia digital. Tudo começou em nichos que abraçaram o vintage como manifesto: o vaporwave e a música eletrônica experimental. Esses gêneros, que parecem ter saído de um sonho cyberpunk dos anos 90, encontraram no K7 o formato perfeito para sua estética glitch e samples de TV a cabo. Artistas como George Clanton e Oneohtrix Point Never foram alguns dos pioneiros em lançar obras mais recentes em fita, transformando o hiss (aquele ruído característico) em parte da experiência sonora.
Mercado global: nostalgia em números
Se você acha que isso é só um hobby de saudosista, se engana. Pesquisas mostram que as vendas de cassetes cresceram 28% em 2023 nos EUA, segundo a Recording Industry Association of America (RIAA). E dessa vez não é coisa de doidão dos experimentos: Billie Eilish lançou edições limitadas de Happier Than Ever (2021) em K7, Taylor Swift soltou fitas do Midnights (2022), e até o The Weeknd surfou a onda com Dawn FM (2022). Nos EUA, a National Audio Company, maior fábrica de cassetes do mundo, dobrou a produção em dois anos. O site Official Charts apresenta Dua Lipa, Kylie Minogue e Sabrina Carpenter como campeãs de venda de k7 em 2024, o que prova que não são só os coroas que se interessam por formatos analógicos.

Mas o que realmente impressiona é o Japão: lá, o K7 nunca morreu. Segundo a Oricon, o país ainda vende 100 mil fitas por ano, e artistas como Hikaru Utada mantêm o formato vivo. Lojas como a Tower Records, em uma reportagem da Nikkei/Ásia, observam que as fitas andam populares especialmente entre pessoas na faixa dos 20 e 30 anos que nunca experimentaram o auge do formato. É como se fosse um time capsule sonoro.
O cassette turntablism, um movimento underground no Japão onde DJs modificam toca fitas para serem usados como toca discos, permitindo técnicas como scratching, traz artistas como Ōedo Technica que, além de tape decks adaptados, também usa aparelhos de karaokê antigos para performances experimentais. A abordagem DIY desafia os limites do DJing tradicional por lá, criando uma estética absurdamente fora da caixa.
Mercado brasileiro: K7 virou trend esquecida?
Agora, segura a caneta Bic pra desenrolar a história: no Brasil, o cassete virou fenômeno nos anos 10. O BaianaSystem, soltou o álbum "O Futuro Não Demora" (2019), e já tinha lançado o clássico moderno "Duas Cidades" (2016) em K7. Pitty fez os fãs chorarem (de alegria) ao lançar uma edição especial de 15 anos do lançamento de "Admirável Chip Novo" em fita, com direito a liner notes escritas à mão. No punk, várias bandas lançaram no formato. Zumbis do Espaço veio com o inédito “Monstros Dominantes” (2019) e Mukeka Di Rato resgatou o clássico “Atletas de Fristo” em 2020.
Mas parece que a trend ficou pra trás, apesar do aumento na produção e venda de vinis. Arrisco dizer que faltam fábricas, selos e distribuidoras que acreditem nas fitas como algumas empresas acreditaram no vinil. A Polysom (que também fabrica vinil), parece que quer matar essa bola no peito, e é quem vem fazendo avanços mais significativos. Falta, talvez, algum artista contemporâneo descoladão e de grande público acreditar no formato (de novo). Já tem empresa investindo em novos toca fitas com design minimalista meio escandinavo.
Mixed by Erry: a história que virou filme
E não dá pra falar de cassete sem mencionar o filme "Mixed by Erry", lançado em 2023. A trama conta a história real dos irmãos italianos que, nos anos 80, viraram piratas do K7, copiando fitas ilegalmente e distribuindo-as como pão quente. O longa é um tributo à era em que a música era física, compartilhada de mão em mão, e um lembrete de que, mesmo na era do streaming, o charme do tangível resiste.

Afinal, por que voltar ao analógico num mundo digital?
A resposta é simples: o cassete é a materialização da paciência. Em um mundo onde tudo é instantâneo, colocar uma fita, esperar ela enrolar, ouvir o click do play… isso é quase meditação. E tem também aquele fator “olha que legal, eu tenho um objeto”, algo que um NFT nunca vai ser, né? Importante dizer também que, quando você compra um álbum físico, ele é seu. Ele não é uma licença, não é um conjunto de zeros e uns, ele é palpável e offline. Não depende de uma assinatura, de um cartão de crédito com limite ou de acesso à internet.
E agora, José? Enquanto alguns torcem o nariz (“Mas a qualidade do som é pior!”, e há controvérsias), os fãs do K7 retrucam: “É justamente isso que a gente quer”. Porque, no fim das contas, não se trata de alta definição, mas de definição emocional. É a trilha sonora de uma época em que a música exigia dedicação (e um pouco de habilidade com uma caneta Bic).